Levanta-se no meio da noite, pega o caderninho e rabisca um recado que ele não receberia, um desabafo que ela não conseguira verbalizar. Foi mais ou menos assim:
– Vou dizer de uma vez só
A minha timidez disfarçada de mulher mutante
Hiperativamente altiva
Espera mais que um sinal
Não tenho prática em decifrar enigmas
Não estudei quiromancia
Meus olhos apenas vêem o que o rosto deixou de esconder
Ouço as palavras ditadas
E minha mineirice, desconfiada, dá um grito de alerta
Antes que eu pule no precipício dos teus braços até não ter mais volta.
Com os dois pés atrás, piso em falso
Mais um entorce e mudo de caminho
Erro a direção
Ando sem poder andar
E me calo ante o inesperado.
E assim, sem um desfecho, ela fecha o caderno, guarda o lápis num canto do criado-mudo, vira-se para o outro lado da cama, sozinha, e volta a dormir.
Outro dia nasce, mais outros tantos se vão, e após uma tarde de chuva com sol, de papo bom, algumas indiretas despercebidas e um pouco de mistério, ele se despede sem um beijo – de novo!?, pensa ela – e ambos se viram em direções opostas, caminhando sem olhar para trás.
Ana.
Texto e foto: Ana Letícia.
Lindo texto! Adorei..parabéns, aguardo outro para mais uma vez encantar-me!
CurtirCurtir